Loreni depilava os
caniços das pernas pensando em ti. Bobs nos cabelos, esmalte úmido nas unhas,
creme no rosto, é hoje! É fogo depilar com cera quente, mas parece que mulher
gosta mesmo é de sofrer.
Loreni que não era besta. A
virgindade estava ali, intacta. Formas existiam milhares e a virgindade Loreni
guardava para um homem como você. Esfregação, Loreni gostava. E como gostava.
Mas casar mesmo só com casa própria e marido rico. Era assim que sempre ouviu
falar. Era assim que ia ser. Enquanto isso...
Você reparte os
cabelos, tentando que os fios maiores cubram a calvície. Você se olha no
espelho. Ih... a barriga está de lascar, começando a cobrir o cinto.Você murcha
a barriga, troca de camisa três vezes, coloca perfume em excesso, arruma as
notas na carteira de modo que as mais altas fiquem na frente, despede-se de sua
velha mãe, compra flores para Loreni e vai para o ponto de ônibus.
Você toca a campainha
daquela casa de tinta descascada e ela surge, cabelos esvoaçantes, unhas
vermelhas, muito batom e pouca roupa, apenas um vestidinho leve de verão,
ombros sardentos de fora.
Loreni recebe as
flores e vai guardá-las na água e então você a vê, de costas, tão magra,
sambando dentro do vestido justo, sem seios nem bunda, apenas dois caniços
depilados surgindo no alto dos sapatos altos e sumindo no estampado da roupa e
você se pergunta por que tanto tesão por essa magricela, com tanta boazuda
dando sopa por aí??
Loreni volta, te dá o
braço e vocês saem.
Você grita TÁXI! TÁXI!
e pede ao motorista que os leve ao cinema. Você grita NÃO quando Loreni ameaça
abrir a bolsa (que só continha pentes e pinturas). Você paga o táxi com uma
nota de mil, paga o cinema com uma nota de mil, vocês se sentam na última fila
e então as luzes se apagam.
Você passa o braço em
volta dos ombros magros da Loreni e ela consente. Você começa a roçar, com a
pontinha do dedo, seu braço sardento e ela suspira. Você puxa Loreni para junto
de si e ela vem e então você a beija, enquanto a sua outra mão, boba, percorre
Loreni em busca de carne. Nada. Mal se percebem os pequenos seios. Azar, é tão
bom deixar que sua outra mão percorra Loreni em busca de nada.
Lá pelas tantas, você
reduz a marcha dos afagos porque Loreni começa a pular na cadeira feito pipoca.
Você viu quando alguém da outra fila olhou pra trás.
Cinemas como esse se
repetiriam toda semana, até que um dia você não aguentou mais e, aproveitando
que a sua velha mãe estava em Minas, convidou Loreni para ir à sua casa.
Ela choramingou,
discutiu se ofendeu, mas foi.
Não, você nunca vai se
esquecer.
Loreni foi de calça
comprida justa e sapato alto, blusa vermelha de manga bufante, mais perfumada
do que nunca.
Você desabotoa o botão
da blusa vermelha de manga bufante, e repara que Loreni tem mais sardas perto
dos seios. E que suas pernas terminam em dois ossinhos pontudos. Você também
vê.
Não, você nunca vai se
esquecer. Foi no sofá da sala, apenas com a luz do abajur vermelho. Loreni era
virgem. Virgem e pura.
Loreni chorou
arrependida e quando ela falou em DEUS você se emocionou tanto que decidiu se
casar.
Você deixou sua mãe
para sempre em Minas. Vocês se casaram numa quarta-feira com bolo e champanhe e
passaram a lua-de-mel em Petrópolis, na casa de campo que seu chefe, tão
gentil, emprestou.
Depois Loreni ficou
grávida e foi só durante a gravidez que você pôde apalpar qualquer coisa
semelhante a dois seios carnudos. Nem engordar Loreni engordou. Ficou com a
barriga pontuda parecendo postiça e as perninhas arqueadas de carregar o novo
peso. Rosamaria nasceu magra feito a mãe.
Foi quando a menina
tinha mais ou menos cinco anos que começaram a buzinar nos seus ouvidos.
Avisos, avisos, conselhos. A princípio você não quis acreditar, mas buzinaram e
azucrinaram tanto que, por via das dúvidas, um dia, de longe, sem ser visto,
você a seguiu. Seu coração só faltou estourar quando, a três quadras de casa,
Loreni entrou no carro do seu chefe e ele a beijou.
Nesse dia você até
bebeu. Chegou em casa tão tarde, e Loreni, magra e calma como sempre, serviu um
delicioso jantar. Você não disse nada. Você não disse nada, mas talvez Loreni
soubesse que você sabia, que você estava bêbado porque agora sabia.
No dia seguinte te
disseram lá na repartição que o seu chefe tinha largado a esposa gorda dele, e
você pressentiu: pela magreza da Loreni. Naquele mesmo dia ela foi embora com
ele e a menina, pra Petrópolis.
E agora você fica aí,
com essa careca, essa barriga cobrindo o cinto, na janela da casa própria, todo
dia, esperando a volta da Loreni.
É melhor que você
traga sua velha mãe de volta de Minas, arranje outro emprego e esqueça.
Loreni casou no
Uruguai.
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