Livre divulgação, desde que citada a autoria.

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

20. Te encontro no Facebook, meu grande amor



       Encontrei você no Facebook. Você está envelhecendo bem, continua simpático, alegre, bonitão. De camisa azul turquesa, um coroa gatão.Rs. Ainda não sei direito sorrir e rir por escrito. Foi um sorriso. Se fosse um riso seria kkkkkkkk. Acho que é isto. Eu te adiciono? Acho que isso se dava no Orkut. Agora a gente solicita amizade, então é isso que eu faço: solicito sua amizade, e aguardo a confirmação, ou a aceitação. Você vai me ignorar? Vi fotos de seus filhos, parecem com você, são bonitos. Me bateu uma saudade imensa. Há muitos anos a gente não bate um papo divertido, há muitos anos não falamos de nós, há muitos anos não bebemos e fumamos juntos, como antigamente. Há muitos anos a gente nem se vê.
       Fiquei lembrando. Da carta que te escrevi de Londres, dizendo que ia voltar para morar contigo, e você nem tinha me convidado, ou me solicitado? Das noites que a gente virava na cama, dos dias que a gente via nascer. Há muitos anos não vejo o dia nascer. Fiquei lembrando. Tivemos momentos únicos, quando a gente consegue juntar juventude, amor, tesão, assunto, beleza, sol, praia, música ao vivo, estrada de terra, planos e futuro. Não planejávamos. Você era muito assanhado. Eu era muito assediada.  Eram muitos pretendentes, de ambos os lados.
       Lembrei da gente tomando uísque. Aprendi a gostar de uísque com você. Da gente dançando, em festas. Como tínhamos festas pra ir, como dávamos festas em casa, inventávamos comemorações do nada, mas detestávamos ano novo, carnaval, natal, e datas marcadas para a alegria. Pensávamos do mesmo jeito, não pensávamos? Será que estou lembrando as coisas direito?
       Mesmo coisas ruins. Lembra quando te peguei dando o telefone para uma loura? Fiquei tão transtornada que achei que ia desmaiar, mas, como você sabe, não perco a pose, fingi que nem era comigo, coração disparadíssimo, cabeça a mil, tudo em segundos, disfarcei e saí picada (como se dizia) e você foi me achar olhando o lago, ou lagoa, não sei, sei que eu fui pra perto de uma água tentando parar de suar e recuperar a voz. Rs. (Foi um sorriso). Com o tempo, aprendi que não podia mesmo te deixar sozinho um minuto, você se engraçava pra cima de alguém, ou alguém se engraçava pra cima de você. Queria, hoje, ter ainda essa capacidade, a de quase desmaiar de ciúmes de alguém.
       Você não era fácil. Apaixonava-se à toa. Mas largava logo as mulheres, comigo tinha um trato, tácito, mas um trato nosso. Não nos envolvíamos em relações duradouras, era só esperar um pouquinho pra que a poeira abaixasse, e depois ligar, que o outro já tinha esquecido.
       Eu não era fácil. Apaixonava-me à toa. Mas sempre voltava pra você. Hoje acho que você também sofria, quando acontecia da gente se encontrar sem querer, e eu estar acompanhada de outro. Você fingia que nem era contigo. Eu achava que você não ligava muito, mas hoje em dia, olhando pra trás, percebo que eu estava jovemente enganada. Fiz você sofrer, sim.
       Tínhamos, como se diz, uma química. E uma física também, por certo. Éramos uma dupla e tanto. Aonde a gente ia, levávamos música. Passei a cantar em público por tua causa. Líamos os mesmos livros, às vezes por pura coincidência. Até hoje digo isso, que gosto de homem que lê. Não me sentia protegida por namorados ricos, nem por namorados mais velhos, nem por relações mais estáveis. Ainda hoje, acho a vida tão incompreensível, e me sinto tão desprotegida por isto, que encontro proteção em homens que sabem mais do que eu. Não sou uma mulher culta. Sou criativa e prática. Acho que é uma receita boa. Digo acho porque não tenho certeza absoluta de nada. Talvez você contasse outra história, se fosse falar de nós.
       Gostávamos de tomar batida de côco no Osvaldo. E eu ficava danada porque você nem esperava a batida acabar no copo e já ia pedindo a conta. Em volta do Bar Osvaldo, um leque de motéis. Na nossa época não usava transar na casa dos pais, como agora. Não conheço teus filhos, você não conhece os meus. Como seria a cara do nosso, se tivéssemos tido algum.
       Pensei em te convidar pra sair, em te adicionar em algum evento, criar um evento só pra nós dois no Facebook, seria divertido. Pensei em te dar uma cutucada virtual, coisa mais boba, essa. Em te marcar numa foto nossa, tenho tantas. Também achei boba, essa ideia de marcar namorados antigos em fotos antigas. Se antes, tudo nos parecia de um ineditismo mágico, hoje tudo me parece repetitivo e óbvio. Falar com ex-namorado casado pela internet, virar noites chateando (rs) e nunca se encontrar ao vivo, mereço? Merecemos mais. Mereceríamos mais.
       Se você aceitar minha solicitação de amizade, vamos ficar visitando a Página da Vida, um do outro, mas sem comentar nada, talvez curtir uma foto de vez em quando, só pra marcar presença. Temos companheiros, filhos, família própria. Não viramos mais a noite no Baixo Gávea, ainda existe? Acho horrível isso, coroas que ficam assediando ex-namorados casados, paquerando pelo Facebook, que pobreza pra nós, que já transamos tanto, e viajamos muito, e curtimos horrores, e brincamos com enlouquecedores. Acho que você nem canta mais.
       Meu violão está sem cordas há anos. Não consigo jogar fora, nem comprar outro novo. Olho pra ele, que foi conosco a tantos lugares, que nos acompanhou em tantas canções. Limpo o violão, de tempos em tempos, como se ele fosse o bilhete válido para uma passagem ao centro da vida, ao miolo dela, àquela época em que se pode ser mais feliz, como nós fomos.
       Era tanto pretendente de ambos os lados. Alguém te fisgou, alguém me fisgou, a gente se deixou levar, éramos como barcos soltos, nos levaram de nós, o tempo passou e a gente não viu.
        Você tem quase mil amigos. Quantas caras na tua Página da Vida. É. Acho que é isso. Não estou mais na tua Página da Vida. Nem nos conectamos. Quando a internet chegou, já estávamos desconectados. Envio uma solicitação de amigo com ou sem mensagem? Ah, que coisa mais careta.
       Sobre o que conversaríamos agora? Sobre as gracinhas de nossos netos? Sobre o passado, para sempre o passado? Que livros você anda lendo? Ainda dá o telefone para as louras? Rolaria uma química? Uma física? Daí a gente se encontraria escondido, de sua mulher e de meu marido? Não merecemos isto. Éramos almas livres, e livres continuaremos com nossas escolhas.
       Prometo escutar sempre nossas músicas, e tomar um copo de uísque pensando em ti. Mas não prometo te enviar uma solicitação de amizade. Tenho certeza que te cutucaria num sábado à noite. E você me marcaria em fotos antigas, trocaríamos frases sem compromisso, e ficaríamos assim, bobos.
       Ou não, podemos estudar a possibilidade de largarmos nossos companheiros e morarmos juntos, apresentarmos nossos filhos, e levarmos os netinhos todos juntos para brincar no play do meu prédio.

       Ufffffffff.....clico em sair. Tomo um ansiolítico e vou dormir.

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