A menina do pentelho azul
Era uma vez uma menina
normal chamada Viviane. Viviane nasceu normalmente em Belo Horizonte, como as
outras crianças. Largou cedo a chupeta e cresceu saudável brincando todos os
dias no play depois de fazer os deveres. Viviane foi brincando e crescendo,
brincando e crescendo, e foi crescendo, crescendo e cresceu.
Na aurora da liberdade
incharam-lhe para sempre o bicos dos seios, a cintura afinou, as nádegas
empinaram, as pernas engrossaram e entre elas brotaram, como uma esvoaçante
nuvem rasteira, penugens azuis. Azuis?
Viviane trancou-se no banheiro e pelo espelho do estojo do pó-de-arroz examinou-se espantada e guardou esse segredo a sete chaves.
Mensalmente sangrou como uma mulher comum, mas não era uma mulher comum, era ainda uma menina que tinha entre as pernas fiapos azuis. Azuis??
Viviane não sabia o que fazer.
Viviane trancou-se no banheiro e pelo espelho do estojo do pó-de-arroz examinou-se espantada e guardou esse segredo a sete chaves.
Mensalmente sangrou como uma mulher comum, mas não era uma mulher comum, era ainda uma menina que tinha entre as pernas fiapos azuis. Azuis??
Viviane não sabia o que fazer.
Então...afastou-se dos
rapazes, enfiou-se nos estudos, passou a se fazer de feia de propósito, fez o
possível e o impossível para nunca ser amada nem amar.
Aos vinte anos ficou séria.
Aos vinte anos ficou séria.
No ápice dos trinta anos
Viviane apaixonou-se por um homem devidamente impossível (ele era casado, tinha
seis filhos, tendências homossexuais e estava justamente naquele mês indo morar
pra sempre no Japão), e escreveu poemas e cartas banhados em lágrimas que
guardou escondido embaixo da última gaveta do armário dos fundos do sótão.
Sempre que ia a jantares,
coquetéis, banquetes, recitais de poesia, palestras, bingos, leilões, e o
assunto nas rodas era pentelho, Viviane corria pro banheiro a pretexto de
retocar a maquiagem.
Primeiras rugas surgiram.
Aos quarenta dedicou-se a
causas nobres. Criou barriga, cachorros e cismas, foi orgulhosa, exigente e
reservada como quem foge do amor. Vez por outra esfregava o ursinho de pelúcia
entre as pernas à falta de um homem. Viviane nunca amou, nunca namorou, nunca
foi feliz. Nunca a ninguém contou que tinha os pentelhos azuis.
Afinal, pentelhos não eram
o tipo de assunto que a interessasse e pronto. Nunca se falou sobre isso.
Depois o tempo passou tanto
que o corpo amoleceu e cansou-se sem que Viviane houvesse, uma só vez, feito o
amor. Os seios ficaram esvaziados, pendurados e cabisbaixos. As pernocas
afinaram e pipocaram, mas os cabelos todos ficaram brancos como uma nuvem rala
sem coragem de chover.
E foi só então que Dona
Viviane sentiu-se uma mulher igual às outras. Igualzinha! Viviane sentiu
vontade de cantar, de usar biquíni fio dental, de fazer uma tatuagem do cometa
Halley entre os seios, de ter amado profundamente, com toda a força do seu
coração. Finalmente uma velhinha de pentelhos brancos exatamente igual a todas
as velhinhas do mundo!!!!!
A história teria terminado
feliz para sempre se (sempre tem um se) não fosse a súbita aparição e sucesso
internacional de uma manequim, Sheyla Leyla, que fez sucesso, amigos, amores,
fama e fortuna às custas de seus excitantes e cacheados pentelhos azuis
(azuis?), que eram os únicos do mundo. Ou, conforme saiu naquela matéria de
capa da revista americana "the only one zull pentels in the whole
wide world".
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